Vasco Graça Moura,
(Portugal, 1942)





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Biographie


Ecrivain et homme politique portugais né à Foz do Douro (près de Porto) en 1942. Après des études de droit à l’université de Lisbonne, Vasco Graça Moura exerce la profession d’avocat (1966-1983). La révolution des œillets lui permet d’entamer une carrière politique qui a fait de lui un grand commis de l'État portugais. Parallèlement il débute une œuvre littéraire jamais démentie. C’est un ardent défenseur de la lusophonie et de la francophonie.

Élu député à l'Assemblée constituante de 1975, secrétaire d’Etat dans deux gouvernements provisoires, Vasco Graça Moura sera directeur de la première chaîne de la Radiotélévision portugaise. Il est ensuite administrateur de l'Office national des publications et des monnaies (1979-1989), puis commissaire général des fêtes commémoratives des découvertes portugaises (1988-1995). En 1996, il est nommé directeur de services à la Fondation Calouste Gulbenkian.

En 1999, Vasco Graça Moura est élu député européen et sera vice-président de la commission de la Culture du Parlement européen. En juin 2004, il est réélu au Parlement Européen.

Vasco Graça Moura a publié depuis 1963 une trentaine d’ouvrages dont une importante œuvre poétique ironique et érudite, des romans, une pièce de théâtre, des pamphlets, ainsi que de nombreuses traductions : des poètes allemands du XXe siècle, des sonnets de Shakespeare, de la Divine Comédie de Dante…

Parmi ses publications : L'ombre des figures (L'Escampette, 1997), une anthologie de ses poèmes ; Camões 1525 1580 (L'escampette, 1994 - 2002) , écrit avec Eduardo Lourenço et son roman Derniers Chants d'amour (La Différence, 1988)


Poème



babel revisited


não comparo babilónia ao mal presente e
nada sei de sião, em termos pessoais,
a não ser por interpostas redondilhas. depois,

sempre deixei que por cá viessem aquelas
humanas figuras e tentassem alterar-me à sua vontade,
algumas vezes propondo-me a mentira em série

e outras vezes a verdade capciosa. a mim, tanto fazia, o importante era virem
ao som da flauta, ao som da lira, ao som
de qualquer outro instrumento ou de nenhum, do clic de um disparador, do

silvo de um berbequim, do simples marulhar da natureza sussurrante
numa página mais ou menos manipulada nos seus meandros,
enquanto me chamavam imaturo, me arremessavam sião, tiravam fotografias

e me pediam bastante movimento. e eu ia assobiando
entre os corais da alma e as marcas de água, os lutos e seus filamentos
incandescentes, e fiz-lhes a vontade a contrapor ontem e hoje

e tudo o mais que se quisesse, ecos, espelhos, sarças íntimas,
reverberações e rotinas, os crepúsculos que iam sendo inventados
entre a tábua rasa e a reminiscência, perfumadas

suspensions of disbelief, cúmplices partilhas de códigos
e melismas… nessa bigorna inútil tudo vibrava à martelada
e para babel ressoar melhor na dissonância o verbo fez-se contraposição,

oposição, proposição, transposição, deposição (ricordarsi del tempo
felice nella miseria, ohimé!, nessun maggior dolore).
entretanto tentei explicar a toda a gente que eu cá não sou assim

de tão abomináveis desgostos e nunca quis atravessar as nuvens
trepando a uma torre, nem esperei o dom das línguas
e muito menos a confusão a partir delas, cá em baixo, downstairs, darling,

yes, yes, donde mana matéria a quanto mal o mundo cria
e onde nos vamos perdendo em traduções e paráfrases do mundo
e citações e excitações do remorso. babel não faz o frete a deus

e deixa o homem desarmado: ele nem quer a mais alta torre,
nem perde a vida por delicadeza, não ata nem zigurata, não trepa
nem sai de cima: ele deixa-se ficar para ali, miserere, miserere,

limita-se a esperar que a noite chegue e vai ouvindo samba,
sem grandes sobressaltos, sem grandes crueldades,
e pede mais qualquer coisinha. é para isso que há subsídios,

compadrios, trepidações. no mundo como vontade e representação,
na confusão de babel, meditativo e melancólico, irónico e literário,
ah, maria, maria, eu vou descalço a imaginar-me em lírios às mãos cheias

e flores de púrpura espalhando-se no caminho, por entre as sombras.
ninguém quer saber de sião nem de músicas celestiais,
ninguém se senta, ninguém chora, ninguém contempla os salgueiros,

e se alguém ainda se abriga, abriga-se sem objecções de consciência,
encolhido entre arbustos e embustes, já nem sequer espalha tristes
palavras ao vento.


elegia breve à poesia

num fugitivo passar pela retina,
no virar de uma esquina ou de um silêncio,
a tua ausência é este ensombramento,

porém que a despedida seja breve
e que voltes com um relâmpago, um
desvendar-se do mundo entrecortando

dobras desamparadas do real.
e eu pergunto: que vozes do crepúsculo
se apagavam então? talvez o vento

agitasse tristezas na folhagem,
e esse fosse o frémito dos seus
melancólicos sinais rumorejando,

ou talvez fosse a cama de hospital
e o branco desolado das paredes
e a mudez de estranhos aparelhos,

ou talvez fosse o próprio esquecimento
de que irias voltar, ou resvalar
numa lenta passagem de tercetos.